01 dezembro 2011

Manobra aprova trocas
de cartórios em Minas

Emenda Frankenstein aprovada pelos deputados em projeto de lei sancionado por Anastasia autoriza a permuta entre os titulares, que antes era feita só por meio de concurso público

Plenário aprovou emenda que permite troca de
titularidade em projeto que aumentou salário do Judiciário


Concedidos apenas por concurso público específico desde a Constituição de 1988, os cartórios de Minas Gerais caíram na mira de especulações e negócios com uma nova regra aprovada pelos deputados. Em uma emenda Frankenstein ao projeto que aumentou o salário dos servidores do Judiciário, o Legislativo passou a permitir a “permuta” dos titulares dos órgãos de serviços notariais e de registros, antes completamente proibida. Na prática, abriu-se brecha para quem passar no concurso para um cartório de rendas mais humildes trocar a titularidade para outro mais lucrativo.

Minas Gerais tem cerca de 3 mil cartórios responsáveis pelos registros civis, de imóveis, títulos e documentos. As rendas para os titulares são variáveis, indo desde os mais humildes, que chegam a dar prejuízo, com cerca de R$ 2 mil  a R$ 3 mil de “ganhos” mensais até os considerados ótimos investimentos, por gerar cerca de R$ 1 milhão ao mês. Para ingressar como tabelião em qualquer um deles é preciso ser bacharel em direito e passar por concurso público para o local específico. A única forma de mudar era participar de concursos de remoção, já que a Lei Complementar 85 de 2005 vedava qualquer troca.

Na lei já sancionada pelo Executivo, passou emenda do deputado Antônio Júlio (PMDB) que admite a “permuta de titulares de serviços notariais e de registro” entre “serventias da mesma natureza. Isso será feito por ato do governador mediante requerimento dos dois interessados, que terão de comprovar quatro anos de efetivo exercício no estado como titulares.

Pego de surpresa pela regra aprovada, o coordenador em Minas Gerais da Associação Nacional de Defesa de Concurso Público para Cartórios (Andecc), Alexandre Scigliano Valério, considerou a emenda totalmente inconstitucional. “Várias regras semelhantes caíram no Supremo Tribunal Federal. A única forma de ingresso é concurso, e permuta não é concurso”, protestou. O coordenador lembra que um estudo do Conselho Nacional de Justiça constatou casos de titulares que, próximos de se aposentar, trocavam cartórios altamente rentáveis com parentes.

A Andecc vai analisar a lei aprovada para ver as medidas cabíveis. Isso já foi feito pelo deputado estadual Délio Malheiros (PV), único a votar contra a regra no Legislativo, que ingressou com representação no Ministério Público estadual. Ele apresentou emenda a outro projeto de lei complementar em tramitação na Casa revogando o artigo da permuta. Para Malheiros, o artigo abre brecha para negociata entre titulares de cartórios, que poderiam vender as serventias. “Chama-se concessão, isso é um escândalo que vai contra posicionamentos do Conselho Nacional de Justiça, do STF e da Ordem dos Advogados do Brasil”, afirmou.

Absurdo

Délio justificou não ter pedido destaque ou verificação de votação – o que poderia derrubar a emenda – porque o líder do governo, Luiz Humberto (PSDB), teria garantido o veto do Executivo à emenda. Luiz Humberto negou. “Não houve compromisso. Ele colocou que seria absurdo e eu falei que se fosse o governo vetava. Mas foi uma emenda tranquila, tanto que aprovada quasepor  unanimidade. Só um deputado reprovou”, alegou. Outro argumento de Délio Malheiros para questionar a constitucionalidade da regra é ela ter sido aprovada por lei ordinária em votação simbólica. O problema é que a alteração é sobre assunto de lei complementar, que requer votação nominal e aprovação por no mínimo dois terços dos 77 parlamentares.

Autor da emenda incluída no segundo turno de votação quando presidia e relatava reunião da Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária, o deputado Antônio Júlio (PMDB) disse inicialmente desconhecer o teor. “Essa emenda não é minha, eu só li”. Em seguida, argumentou haver critérios para a permuta, como o fato de serem serviços da mesma natureza, e ainda lembrou que, em última instância, caberá ao governador decidir se permite ou não. “Se for absurdo o governo não faz”, replicou. Aprovada na semana passada, a lei do aumento do Judiciário com a emenda Frankenstein dos cartórios foi sancionada pelo governador Antonio Augusto Anastasia (PSDB) e publicada no Minas Gerais de sábado.
(Uai Notícias)

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